Texto de: Thyago Coutinho
Arte de: Fresh Gvbs
Revisão de: Tiele Kawarlevski
No mês passado, completaram-se 2 anos da morte de um dos maiores produtores de filmes dos EUA, John Singleton. Primeiro afro-americano a ser indicado ao Oscar de Melhor Diretor, Singleton é, até hoje, o cineasta mais jovem já indicado na categoria Direção.
Com apenas 22 anos, Singleton roteirizou e dirigiu a obra "Boyz-N-The-Hood" (Os Donos da Rua), que retrata o cotidiano complexo de afro-americanos em Los Angeles, expondo seus dilemas e a vida entre gangues e racismo. Com atuações marcantes de Angela Bassett, Laurence Fishburne, Cuba Gooding Jr e o rapper Ice Cube, o filme evidencia como os conflitos entre jovens negros em Los Angeles são oriundos de um projeto discriminatório doentio, promovido pelos detentores do capital.
Além disso, Singleton mostra, por intermédio dos personagens, como a influência ou ausência da família pode colaborar para que esses jovens acabem seguindo (ou não) o caminho da violência. Enquanto Tre Styles tem um pai presente que o ensinou a se afastar da criminalidade, Doughboy se sente abraçado pelo crime por ter uma mãe distante e que lhe deixa claro como não se importa com o filho.
A rotatividade do crime é retratada sem cair em moralismos. Aqueles que vão para o crime realizam uma ação orgânica, seus pais e irmãos também foram de gangues, estiveram em contato com a criminalidade e foram educados em meio à violência. Perpetuam guerras que não os pertencem no lugar daqueles que se aproveitam de seus privilégios sociais e são esquecidos.
Não satisfeito com o brilhante sucesso no início dos anos 90, Singleton produziu, na mesma década, mais três filmes: “Sem Medo no Coração” com Tupac Shakur, Janet Jackson e Regina King; “Duro Aprendizado” com Ice Cube, Laurence Fishburne e Regina King; e “O Massacre de Rosewood” com Ving Rhames, Don Cheadle e Jon Voight, engrossando suas raízes na crítica ao racismo, machismo e violência institucionalizada.
Já na virada do século 21, John dirigiu diversos outros filmes, os mais conhecidos dessa época foram "+ Velozes + Furiosos" e "4 Irmãos". O que hoje é sucesso de crítica e bilheteria da Marvel, "Pantera Negra", podia ter sido gravado nos anos 90, estrelado por Wesley Snipes e Chiwetel Ejiofor (12 Anos de Escravidão), e dirigido por John Singleton. Conseguem imaginar?
No início da década de 90, Wesley Snipes conseguiu convencer a Columbia Pictures a bancar a produção de um longa que fosse inspirado no herói dos quadrinhos. Antes que o projeto fosse engavetado, Snipes e Stan Lee passaram anos analisando roteiros e conversando com diversos diretores e produtores, e John Singleton foi um dos consultados. Wesley Snipes contou ao The Hollywood Reporter que Singleton tinha uma ideia menos futurista, planejava representar o Pantera Negra por meio de um pai tentando atrair seu filho, de temperamento difícil, para o movimento dos direitos civis.
Ainda que o projeto com a Marvel não tenha avançado, John Singleton continua sendo um grande nome do cinema norte-americano, usando a arte para denunciar o cinismo branco frente à morte de negros e, assim, fazer mais do que responder aos jornais racistas que os estereotipavam, devolvendo a humanidade retirada à força dessa parcela marginalizada da população. Por isso e por tudo, temos muito o que lhe agradecer. Obrigado por tudo, John.
John Daniel Singleton
6 de Janeiro de 1968 — 29 de Abril de 2019
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